A querida Ana-C leu, gostou e mandou há pouco o artigo que o Demétrio Magnolli escreveu na Folha de S.Paulo de hoje. Para quem não viu, em "A Hora e a vez do Caveirão”, o geógrafo e cientista social, das bandas da USP, olha para os ‘dez dias em que os militares abalaram as favelas cariocas’ e diz, entre otras cositas, que:
1) A negociação ‘sigilosa’ entre o Exército e o narcotráfico, representado pelo ‘Estado Paralelo’ instituído pelo Comando Vermelho no Rio de Janeiro, foi tão explícita, mas tão explícita, que só faltou os dois lados ‘trocarem embaixadores’ para agilizar o retorno das armas roubadas.
2) A mídia, encastelada em Higienópolis ou no Alto Leblon, caiu – ou quis cair – na velha narrativa do mocinho contra bandido e embarcou na batalha patriótica do Exército contra os traficantes. Cada um tem o Iraque que merece, né mesmo?
3) Fato: em dez dias de ocupação o Exército não capturou sequer um, unzinho, dos chefes do tráfico na cidade. Mas, usando de mandados judiciais ilegais (os tais ‘mandados coletivos’), revistaram os pobres (inclusive crianças) e invadiram suas casas com a complacência do Ministro da Justiça do governo dos companheiros.
4) A volta da ‘normalidade’, para quem vive na favela, é apenas a substituição do urutu pelo ‘caveirão’. Saem os tanques, voltam os carros blindados da PM com seus mega-fones intimidadores, que resumem a política de segurança dos Garotinho: a criminalização da população (até que se prove o contrario, todo favelado é suspeito) e o ‘conluio tácito com os traficantes’.
5 )Este ‘acordão ’se dá nesta nova fase da novela das drogas no país: vive-se o momento da territorialização explícita do narcotráfico, espécie de embrião de uma ‘colombianização’ do país, onde manda quem pode, negocia quem tem juízo e obedece quem não tem mais saída.
Em suma, o velho discurso de que o Estado precisa fazer sua parte nunca foi tão urgente. Ou bem se incorpora a favela ao país – com hospitais, postos de saúde, escolas, creches e, ‘ahá’, delegacias de polícia – ou estamos rumando em velocidade máxima para uma crise de soberania sem mais tamanho. Aos antropólogos da Gávea resta o consolo de que, ao menos por enquanto, ainda não estamos importando soldados ianques para fazer o trabalho sujo.
Para assinantes da Folha ou do UOL, o texto completo do professor Magnolli, uma ótima leitura, está aqui.
quinta-feira, março 16, 2006
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