quinta-feira, novembro 03, 2005

Chavito!


O jornal argentino "Pagina 12" anunciou com toda pompa domingo o objeto mais popular entre os militantes de esquerda em Mar del Plata: o bonequinho do Chavez. Pode?

Do meu iPod - Leroy Carr


Uma de minhas alegrias tem sido ouvir Leroy Carr (1905-1935). Foi ele, mais do que qualquer outro bluesman, quem fez a ponte, nos anos 30, do blues rural para o urbano, dando o tom do que seria a cena da música popular americana depois da Segunda Guerra Mundial. E fez tudo isso de seu piano. Carr formou em 1928, em Indianápolis, uma dupla com o guitarrista Francis Scrapper Blackwell que rendeu mais de 200 composições, coisas finas como “How Long, How Long Blues”, cantadas um tom abaixo de seus ídolos do blues rural. Esta, aliás, não por acaso, era a musica favorita de Robert Johnson.

Antes da fama, o adolescente Carr tocou seu piano em circo, passou um tempo no exército e, claro, participou da indústria do ‘bootleggin’ no sul americano, destilando e vendendo seu uísque ilegalmente durante a Lei Seca. Mas sua vocação principal era mesmo o blues. Muito se fala no piano de Carr. Eu ando mais fixado em sua voz. Na cadência mais rápida e menos lânguida de quem quer dar o recado com a maior rapidez possível. Uma voz nasal, tensa, furtiva. Mas divina.

Durante sete anos, entre 1928 e 1934, Carr e Blackwell gravaram para o selo Vocalion alguns dos mais belos blues jamais escritos pelas bandas de cá. E também, vá lá, outra razão para minha paixonite por Carr, baladas e coisas mais ou menos similares ao vaudeville e ao ragtime. Seu desprezo pelos clubes fechados e pepitas como “Midnight Hour Blues” e ‘Shady Lane Blues’ o transformaram em algo como uma estrela pop da época. Derrotado pelo alcoolismo, ele morreu em abril de 1935, no auge da fama. Para ele Amos Easton escreveu, a doída “The Death of Leroy Carr”, que diz assim:

“Agora gente, eu vou contar, da maneira mais fiel possível, como Leroy Carr morreu. Ela era meu melhor amigo. Em um domingo, exatamente às nove da manhã, aquele trem passou por cima dele, e ele começou a estrebuchar. Ele então disse: Senhor, tenha piedade, estou tão desesperado! E me pediu, por favor, que fizesse tudo o que pudesse por ele. Na segunda-feira de manhã bem cedo, logo que o dia nasceu, nós começamos a chorar, quando ele começava a morrer. Eu então liguei para o médico e quando ele chegou, minha gente, Leroy já havia morrido e nos abandonado”.

Blackwell seguiu carreira, e até hoje é considerado um dos maiores compositores da primeira geração do blues urbano. Mas pouco se fala de Carr. Quando o blues virou notícia de jornal, ele já era uma lenda. Ray Charles e Elmore James regravaram seu "Blues Before Sunrise", em inspiradas versões. Muddy Waters contou que a primeira música que aprendeu a tocar na guitarra foi "How Long". Count Basie fez versões apenas para o piano dos sucessos de Carr. E o primeiro hit de Nat King Cole, "That Ain't Right", era, como conta o crítico Eliah Wald, 'infestado da música de Carr'. E o especialista Arnold Shaw diz que a balada soul começa em Carr, passa por Dinah Washington e Sam Cooke, desaguando em Otis Redding e Jerry Butler.

Favorito de gente como T-Bone Walker, Otis Spann e, acima de todos, John Lee Hooker, o gênio esquecido dos anos 30 sobrevive em coletâneas lançadas a partir dos anos 90. Meu disco favorito saiu por aqui pela Magpie e se chama ‘The Piano Blues 1930-1935’, reunindo o que ele e Blackwell produziram de mais interessante e que, uma década depois, seriam a base para o que de melhor se tocou numa certa Chicago.

Quem quiser ouvir um pouco do blues suave e urgente de Carr pode aproveitar e correr lá no “The Smudge of Ashen Fluff”, do blogueiro de muito bom gosto Canowine.

“New How Long, How Long Blues, Part 2” e “Sloppy Drunk Blues” valem a clicada: http://popdrivel.blogspot.com/2005/10/sloppy-drunk-blues.html

quarta-feira, novembro 02, 2005

Diretinho da Redação (34)



A AMERICANIZAÇÃO DA POLÍTICA BRASILEIRA

Já são favas contadas o referendo do dia 23 de outubro. Sim ou não? Ora, o que menos importou, já é consenso, foi se posicionar sobre a livre comercialização de armas de fogo e munição no território brasileiro. Mas, para além de uma derrota do governo ou de um recado dado pela população à classe política – uma versão verde-e-amarela do “Que Se Vayan Todos” – chama a atenção um aspecto pouco explorado das seqüelas deste plebiscito inoportuno: a galopante americanização da cultura política brasileira.

Um dos melhores textos sobre o que de fato aconteceu no dia 23 de outubro foi a análise de Wilson Tosta, no site ‘Vida & Política’, sobre a consolidação de um novo pensamento conservador brasileiro, ‘supostamente racional e capaz de dialogar com faixas do eleitorado que chamamos de progressista’. O jornalista chama a atenção para a tática de apreensão do imaginário popular a partir da ‘racionalização do irracional’. A direita brasileira deixa de lado os Sivucas e os Bolsonaros e substitui o ‘bandido bom é bandido morto’ por um discurso ‘aparentemente’ não-emocional, com ênfase no direito individual.

Depois do fim da ameaça vermelha, foi justamente este movimento – a substituição do medo dos comunistas, dos pobres, das massas, dos imigrantes, pela aversão aos homossexuais, aos pró-aborto, aos verdes – que impulsionou a sociedade americana a eleger por três vezes um presidente com sobrenome Bush e a transformar o Capitólio – inclusive nos dois governos Clinton – em domínio absoluto dos republicanos. Aqui, as chamadas ‘guerras culturais’ são centradas na idéia de que a ‘elite liberal’ é formada por milionários da Park Avenue e estrelas excêntricas de Hollywood, interessados em impregnar a sociedade de valores alienígenas à grande massa ordeira e trabalhadora. Valores que não se coadunam com a tradição puritana de um pais imaginado por missionários.

E o que nós temos com isso? Tosta conta que no Brasil vai-se erguendo diariamente um muro entre as ‘elites esclarecidas’ e o povo ‘abandonado’. A propaganda do ‘sim’ menosprezou este aspecto: o que pode me dizer esta gente que vive em condomínios fortemente protegidos com seguranças por todos os lados ou em suas coberturas na Vieira Souto, de frente para o mar? Se é bom para o Chico Buarque e para a Fernanda Montenegro, porque é que seria para mim também? Os defensores do não se apresentam como ‘gente comum’, distante dos privilégios das ‘celebridades’, interessados em preservar os ‘direitos individuais’ do grosso da população. Este raciocínio encontra campo naturalmente fértil no Brasil, com a notória incompetência do setor público para resolver nossos gigantescos problemas sociais.

Em um movimento raro na política brasileira, o plebiscito do dia 23 marca o avanço do conservadorismo para além de seu gueto social e político. Mais: ele se consolida como primeiro herdeiro oficial do PT ao tomar deste o discurso moralista que o impulsionou – na definição brizolista da ‘UDN de macacão’ – nas décadas que passaram. Esta inversão de papéis no tabuleiro político revela-se tão instigante quanto perigosa. Não é por acaso que próceres da ‘nova’ direita já decidiram centrar sua munição em alvos bem específicos: a redução do limite de idade (fala-se em 12, 13 anos) para a penalização de infratores jovens, a oposição à união civil dos homossexuais, o combate à regulamentação do consumo e venda de drogas e do aborto. Vem mais por aí.

links: DR: www.diretodaredacao.com
Vida & Política: http://www.blog-se.com.br/blog/conteudo/home.asp?idBlog=11888