quinta-feira, agosto 18, 2005

Diretinho da Redação (25)

O texto abaixo pode ser lido no www.diretodaredacao.com e no www.click21.com.br


VOVÔ TERIA UM TROÇO


Neto de político, passei boa parte de minha infância ouvindo causos sobre Miguel Arraes. Meu avô adorava me vender os homens públicos de antanho como seres sobrenaturais, super-heróis mais brasileiros e humanos dos que eu poderia encontrar nos gibis. A morte do ex-governador pernambucano me encheu de lembranças do "Dotô Arraia", personagem destacado das forças do bem que tinha o poder de criar, do nada, a abençoada chuva tão aguardada pelos sertanejos. E em quem, eu escutava com olhos arregalados, bastava se tocar na fronte para se ter sorte por toda a vida. Vovô gostava especialmente de narrar a história "Arraia e as leis trabalhistas". Finalmente, me dizia, os camponeses haviam vencido a tirania dos usineiros, os bandidos deste faroeste improvisado no árido nordeste da imaginação do vovô.

Super-heróis não cabem na política. Especialmente os que acreditam em seus poderes. Fico aliviado em saber que vovô vibrou com o primeiro governo de Arraes, nos anos 60, mas que mal percebeu a segunda passagem do político pelo Palácio das Princesas (mas bem que ele repetia, feliz da vida, três batidinhas ritmadas no tórax, seguidas de três risadinhas, nem duas, nem quatro: "ele vai entrar pela porta que saiu", referindo-se, claro, à resistência do governador em 1964). Mais importante ainda, ele aqui já não estava quando nosso abatido super-herói, cansado de idas e vindas à Sala da Justiça, enredou-se na trama viciada dos precatórios.

Foi justamente quando tentava se reeleger, em 1998, que Arraes chamou para sua campanha um tal de Duda Mendonça. Ao perceber que não havia chance de lutar contra a criptonita do Plano Real, o marqueteiro tentou convencer o governador a abandonar a peleja. Foi quando, Arraes, antípoda da "esquerda de resultados", lhe disse que, no mundo da política, "há eleição em que a gente ganha eleitoralmente e perde politicamente. E há eleição em que a gente perde eleitoralmente e ganha politicamente".

A mensagem não poderia ser mais atual. O abatido super-herói perdeu a batalha com a maior dignidade possível, mas Duda jamais compreendeu o sentido daquela sentença. Tive esta certeza na semana que voou. Enquanto Arraes enterrava consigo uma estirpe de homens públicos que não volta mais, Duda, em última instância o principal responsável pela imagem da "República Petista", confessava crimes gravíssimos, como sonegação fiscal e recebimento ilegal de dinheiro em paraísos fiscais.

E disse, televisão escancarada agora em outra sala de estar, que "poderia dormir tranqüilo, pois não cometera erro de honestidade e estava liberado para beijar e abraçar seus filhos". Vovô teria um troço. E ficaria arrasado ao imaginar aquelas crianças de Duda desprovidas do mundo fantástico em que os superpoderes dos políticos eram resumidos em honra e caráter - remédios infalíveis para se derrotar as forças das trevas.

terça-feira, agosto 16, 2005

Triste Fundo De Pensão

Para quem ainda não leu, a cacetada de Jânio de Freitas, na Folha de S.Paulo de hoje, no sumido José Genoíno:

José Genoino requereu, para receber a partir deste mês, R$ 8.148 a título de aposentadoria por seus 20 anos de deputado. O provento corresponde a cerca de 65% do vencimento de deputado ativo. Ativo? Quem? Digamos, deputado com mandato.

José Genoino tem um bom motivo para a reivindicação e o recebimento: "É uma questão de sobrevivência".José Genoino, quando voltar a ter coragem de aparecer e falar em público, por certo vai explicar de que questão se tratava para os idosos e doentes cujas aposentadorias indecentes ele, como deputado e como presidente do PT no governo Lula, tanto contribuiu para tornar humilhantes e mais degradantes da velhice e da doença -não depois de 20 anos, mas de 35, 40 e mais anos de trabalho verdadeiro.

A rigor, nem essa explicação se precisa mais ouvir desse José Genoino que se esconde atrás da própria sombra, para fugir às altas responsabilidades que lhe cabem na montagem e na operação, dentro da Câmara e entre os partidos, das imoralidades que se desvendam.

Aaaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiiiiiieeeeeeeeeeeeeeeeee!



Alguns amigos deste blog que tinham visto os primeiros ensaios na Costa Oeste já tinham me dito que a coisa era horrenda. Agora Ben Brantley, no The New York Times, esculhambou de vez com o espetáculo autorizado por Yoko Ono. A reação a Lennon (acima Will Chase, um dos cinco 'Lennons' do espetáculo, em foto de Joan Marcus) é resumida na crítica a um daqueles gritos primais de Yoko: aaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiie!

De acordo com Brantley, Lennon aparece mais como o ‘parceiro criativo de sua mulher japonesa’ do que como um Beatle ou gênio do pop. Artificial, boboca, non-sense, musicalmente xoxo. Estes são apenas alguns dos adjetivos usados pelo crítico no texto que pode ser conferido na seção de artes do jornal nova-iorquino. Pelo visto, Lennon, que eu não posso deixar de perder, vai ter o mesmo destino da adaptação das músicas dos Beach Boys para o palco, o maior mico da temporada passada da Broadway. A parceria rock e teatro já viveu dias melhores...

CONGRESSO TRAPALHÃO. ONDE? NOS EUA!

Na terça-feira passada o jornalista Henry Fountain, do The New York Times, estava tocando uma reportagem sobre a nova legislação relativa à Energia aqui nos Estados Unidos, enviada ao Congresso pelo presidente Bush, quando se deparou com um fato curioso. Incluída no último minuto pelo deputado republicano Ralph M.Hall havia uma emenda que previa a liberação de US$ 250 mil para os estudos de algo chamado ‘cold cracking’ do petróleo.

A fim de saber que diabos era o tal do ‘cold cracking’, Fountain ligou para o legislador. Este confessou não saber exatamente do que se tratava. Mas avisou que havia incluído o tal adendo de última hora a pedido de outro deputado republicano, Mike Rodgers, do Alabama. Lá foi Fountain perguntar ao ilustre representante sulista, que também não conseguiu explicar a necessidade de estudo do tal ‘cold cracking’ do petróleo. Mas ele indicou ao repórter a fonte perfeita: Bud Brainerd, presidente da Renaissance Petroleum Technologies, que, exatamente por se tratar da única empresa no mundo que estuda o ‘cold cracking’ invariavelmente vai receber a bolada do contribuinte norte-americano.

Fountain descobriu que a sede da Renaissece fica em Auburn, no mesmíssimo Alabama do deputado Rodgers. Em uma entrevista por telefone, Brainerd explicou que o ‘cold cracking’ é uma forma alternativa de refinar petróleo, esmigalhando longas cadeias de hidro-carbonetos por um processo similar ao da esterelização de equipamento médico (ou seja, exposição aos raios gama) mas que, ele frisa, não tem nada a ver com radiação. O ‘cold cracking’ reduziria os riscos de um processo que hoje é feito em alta temperatura. No entanto, até agora, ele só foi realizado em laboratório e os US$ 250 mil serão utilizados, diz Brainerd, justamente para provar que esta nova tecnologia pode ser um belo investimento para os Estados Unidos. Ao menos agora os dois deputados devem estar sabendo para que, afinal, incluíram a tal emenda na nova legislação de energia.

Pílula da Noite

De uma antiga entrevista do por aqui cada vez mais cultuado escritor chileno Roberto Bolaño (1953-2003) à Playboy mexicana:

Sou um latino-americano. Meu único país são meus dois filhos e, talvez, embora em segundo plano, alguns momentos, ruas, restos ou livros que carrego comigo.