sexta-feira, outubro 26, 2007

ENTREVISTA/Chris Anderson


O Valor Econômico publicou hoje minha entrevista com o jornalista Chris Anderson, editor-chefe de uma das revistas mais interessantes dos EUA, a Wired. Aí vai:

A era dos mercados infinitos
Por Eduardo Graça, para o Valor
26/10/2007


Ele foi um dos primeiros a usar a internet, muito antes de a "Wired", revista da qual é editor-chefe, ser lançada em 1993. Chris Anderson, de 46 anos, acredita que a melhor definição para tecnologia é "a capacidade de dar poder ao indivíduo para modificar o mundo". Um típico libertário do Vale do Silício, opositor ferrenho a qualquer interferência governamental na vida dos cidadãos, o ex-editor de tecnologia da revista "The Economist" lançou neste ano um dos livros mais comentados no mundo dos negócios: "A Cauda Longa" (Campus/Elsevier, 256 págs., R$ 57,50). A obra nasceu como uma pesquisa sobre as transformações na indústria musical, transmutou-se em um artigo, o mais comentando da história da "Wired", e finalmente chegou às livrarias anunciando o fim do monopólio da sociedade de consumo de massas e o apogeu dos mercados infinitos.

O título do livro refere-se à sua apropriação da convencional curva de demanda utilizada pelos economistas: no topo estão os hits, na cauda os produtos de aceitação menor. O raciocínio convencional é o de que é preciso fazer que a maioria dos consumidores se dirija para a cabeça da curva, pois é mais custoso trabalhar um número maior de produtos. Anderson propõe que a máxima não vale mais no mundo da sociedade de nicho.

A diminuição dos custos com a distribuição de bens tem modificado essa curva de forma radical - um novo animal surge, com a cabeça cada vez mais diminuta e a cauda mais extensa. Parece conversa de ficção científica? De sua casa, em São Francisco, Anderson jura que não há nada de anormal no fenômeno que afeta a indústria cultural tal qual a conhecemos, assim como nossa noção de identidade nacional e a maneira pela qual nos expressamos politicamente.

Fã do ministro Gilberto Gil, o jornalista, que participa em São Paulo de um seminário sobre o futuro da economia mundial durante a ExpoManegement, conversou pelo telefone com o Valor.


Valor: Não é uma ironia imensa o fato de seu livro, que trata do fim da era dos blockbusters, ter se tornado um best-seller?
Chris Anderson: Sim, mas esta é apenas uma das ironias sobre o livro. Há muitas outras. Pense no fato de eu trabalhar para a mídia convencional, como a "Wired", a maior revista de tecnologia do planeta, parte da Condé Nast, por sua vez a maior editora de publicações jornalísticas dos Estados Unidos, que vende mais de dez milhões de revistas todos os meses. Mas esse é meu trabalho diurno. De noite, você me encontra celebrando a economia do nicho em meu blog, na micromídia, nos meus escritos.

Valor: Ou seja, o mundo mais especializado, muitas vezes mais sofisticado, vive hoje lado a lado com a velha sociedade de massas que imperou durante o século XX...
Anderson: Sim, não se trata de anunciar a morte da economia de consumo de massas e sua substituição por algo mais segmentado. Mas é o momento de constatar o fim do monopólio dos blockbusters. Isso acabou. Hoje é preciso considerar a extensão e o tamanho da cauda do mercado e não apenas sua cabeça gigantesca.

Valor: O sr. acredita que sociedades mais periféricas, com poder de consumo mais reduzido, como o Brasil, vivem esse fenômeno de forma igualmente intensa?
Anderson: Se estamos pensando no poder de escolha do consumidor, é claro que faz uma diferença grande se considerarmos o poder de compra e o acesso à internet em cada país. Quanto mais renda você tem, acompanhada do acesso à rede de computadores, mais oportunidade você terá de fazer parte do mercado segmentado e essa equação pode ser problemática quando pensamos no chamado mundo desenvolvido. Mas, por outro lado, a demanda mundial por produtos oriundos dos mercados ditos periféricos aumentou muito. Um exemplo claro é a cultura brasileira. Todos querem consumir cultura brasileira, de um modo ou de outro, no mundo desenvolvido. A audiência global - e o potencial número de consumidores - para tudo o que for ligado ao Brasil cresceu incrivelmente nos últimos anos. E são consumidores que não tinham acesso a esses produtos, como, por exemplo, a gigantesca produção musical produzida no país ou mesmo o esporte.

Valor: Hoje um americano pode assistir a um jogo de futebol da Copa Libertadores da América em tempo real tanto na TV quanto na internet...
Anderson: Exatamente! No novo mercado, consumidores de todo o mundo podem entrar em contato com aspectos específicos da vida de outros países de uma forma inédita. Pense na "diáspora do críquete". Trata-se de um esporte completamente obscuro nos EUA. Mas hoje temos aproximadamente 40 milhões de pessoas oriundas da Índia, do Paquistão, da Austrália, Nova Zelândia e Grã-Bretanha, países em que o esporte é muito popular, trabalhando e vivendo por aqui, embora não concentrados em uma única região do país. Pois bem, agora essa gente toda - um mercado considerável em qualquer estimativa - pode ver os jogos de críquete em tempo real. É uma audiência global para um típico produto da sociedade de nicho.

"Vejo Gilberto Gil como antídoto à velha economia dos blockbusters. Nós o vemos como modelo para os brasileiros e para o planeta".

Valor: O sr. viaja ao Brasil pela primeira vez. Há alguma expectativa em se aprofundar em relação a casos típicos do mercado segmentado no país?
Anderson: Ficarei no Brasil apenas por algumas horas e não acredito ser possível fazer maiores reportagens. Fui convidado pessoalmente para o evento pelo ministro Gilberto Gil e minha única expectativa é a de tentar me encontrar com ele e ouvi-lo um pouco. Em 2003 a "Wired" foi uma das patrocinadoras de um show em benefício do Creative Commons, projeto elaborado pelo professor Lawrence Lessing, da Universidade de Stanford, que gera instrumentos legais para titulares de direitos autorais, como Gil, liberarem sua obra para usos dos mais variados. E ele se apresentou com David Byrne. Gil está constantemente em nossas páginas, por ter colocado o Brasil na posição de pioneiro na adoção do Creative Commons no mundo e por sua visão lúcida sobre a nova realidade dos direitos autorais na sociedade do remix. Ele está em meu radar por um longo tempo. Ele é único ao representar hoje, ao mesmo tempo, a cultura do remix, a cultura popular, a cultura segmentada. Gil entende a importância da diversidade em todos os níveis, não apenas no cultural. Vejo-o como um antídoto à velha economia dos blockbusters e, por isso, nós o vemos como um modelo não só para os brasileiros, mas para o planeta. Não vejo a hora de encontrá-lo.

Valor: Gil é um dos maiores nomes da música popular brasileira e o sr. iniciou a pesquisa de "A Cauda Longa" justamente pela indústria musical...
Anderson: É que este é um dos mercados em que variedade, por incrível que pareça, era um item raro antes da explosão do mercado de nicho. O Wal-Mart vende hoje cerca de mil títulos musicais em CDs. Mas na internet há algo estimado como 3 milhões de faixas disponíveis legalmente nos serviços de venda digital. A indústria musical é um exemplo claro do blockbuster desagradando tanto ao consumidor quanto ao artista. Foi ao perceber o tamanho do mercado musical localizado na "cauda" da curva de consumo que as majors da música teimavam em ignorar que encontrei a idéia para escrever o livro.

Valor: Em seu blog o sr. tratou com especial interesse da decisão da banda inglesa de rock Radiohead de vender seu novo trabalho exclusivamente na internet e de deixar para os compradores a tarefa de definir o preço a ser pago, incluindo a possibilidade de baixá-lo gratuitamente...
Anderson: Esse movimento reflete o cada vez mais diminuto poder do modelo de venda de música tradicional, criado pelas grandes gravadoras. Trabalhar as músicas no rádio e colocar CDs nas melhores lojas do gênero não vale mais. O formato digital permite maior flexibilidade na hora de estabelecer os custos do produto. A indústria musical não é mais simplesmente fundamentada na venda de músicas. Seu produto, atualmente, é a venda de performances. O Radiohead ganhará muito mais dinheiro em seus shows, levando as pessoas que ouviram suas músicas para os estádios, do que com a venda online. A Madonna acabou de encerrar um contrato de décadas com uma grande gravadora para fechar com uma produtora de eventos musicais. Os Rolling Stones faturam mais de 90% de seu orçamento com as turnês mundiais. O iPod é hoje parte importantíssima da indústria musical do século XXI, embora completamente ignorado pelas grandes gravadoras.

Valor: Mas não há o risco de esse mundo maravilhoso das opções sem fim enterrar a possibilidade de identificação nacional por meio de um produto específico da indústria cultural, fenômeno típico da sociedade de massas?
Anderson: Você está correto. Fragmentação, inevitavelmente, impõe uma diminuição no poder de atração da cultura popular.

Valor: Penso, no Brasil, no caso da diminuição crescente da audiência das telenovelas, que nos anos 1970 e 80 foram, talvez mais do que qualquer outro produto da indústria cultural local, o termômetro social e político do país...
Anderson: Nos Estados Unidos dos anos 1950 os americanos estavam todos vendo "I Love Lucy" e se encontravam como nação, de certa maneira, naquele programa. Mas nós não podemos limitar nossa identidade como nação àquela cola poderosa que nos gruda ao aparelho de TV. Não existe mais apenas uma cultura nacional, uma cultura de massa. Mas este é apenas um aspecto de nossa cultura. E vai haver sempre algo, creio, que nos unificará como nação. No Brasil, por exemplo, pode ser a seleção nacional e a Copa do Mundo. A televisão, certamente, não o será mais. Ela só existia daquela maneira porque a oferta de produtos era diminuta.

Valor: Aplicando esta regra para o mundo da política o senhor acredita que a sociedade de nicho nos faz cada vez mais interessados em pessoas que representam certos interesses específicos e menos em partidos políticos que ainda trabalham com a idéia de representação de classe social?
Anderson: Sem dúvida alguma. Em cada país, obviamente, o impacto da sociedade de nicho tem um peso diferente. Nos EUA, ao contrário do Brasil, temos um sistema de bi-partidarismo que é o oposto exato da possibilidade de escolhas. A limitação é óbvia, mas cada vez mais aumenta o número de eleitores e políticos que não se identificam mais com partido algum, como o prefeito de Nova Iorque, Michael Bloomberg, ou o próprio governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, adeptos de uma política mais granular, distantes de modelos estanques. Em geral, mesmo em países que vivem um sistema de partido único, como na China, ou de dezenas de legendas, como no Brasil, os eleitores pensam hoje de forma mais independente, menos ligada a cânones estabelecidos de cima para baixo. Hoje em dia acho que não podemos mais pensar na massa popular, e sim nas massas populares, que competem entre si em busca de mais representatividade. Não estou profetizando o fim da sociedade de massas, e sim a deterioração de seu protagonismo, de seu monopólio, em todos os setores de nossa sociedade.










quarta-feira, outubro 24, 2007

Cool in NYC

A revista CasaClaudia, em sua edição de luxo, publicou um texto-legenda meu sobre o Monkey, um bar sensacional aqui de NYC, oitentão mas cheio de bossa. A foto é de meu amigo Victor Affaro. O Monkey fica na Rua 54, uma das poucas atrações realmente recomendáveis de Midtown East.