sábado, maio 03, 2008

Adoção no Brasil

Leio hoje, em editorial da Folha de S.Paulo sobre a criação do Cadastro Nacional de Adoção (que pretende unificar dados de todos os Estados da federação sobre crianças a serem adotadas e candidatos a pais adotivos), que em São Paulo a procura supera em muito a oferta. São 7.500 brasileiros e 300 estrangeiros buscando adotar cerca de 1.000 crianças. Os dados oficiais, de 2005, mostram como o tema é mais complicado do que parece: 99% dos pais querem adotar apenas um filho, 83% o querem menor de 3 anos de idade e 49% só querem uma criança branca. Do outro lado, a realidade é bem outra: 52% das crianças são negras ou mestiças, 87% maiores de 3 anos e 56% vivem nos abrigos com mais de um irmão. Como diz o editorial - O que importa é modificar a cultura dos pretendentes a pais, para que aceitem crianças reais e não idealizações.

O assunto me toca especialmente porque sou filho adotivo. E faço parte da exceção estatística - branco, menos de 3 anos, sem irmãos. Minha mãe, em um processo diferente, também foi adotada. Mas foi separada por anos a fio dos muitos irmãos. Hoje, conjecturamos, na família que formei, a possibilidade de adotar um dia, levando a experiência para a terceira geração. Questões como a possibilidade de adoção por casais estrangeiros, homossexuais, bi-nacionais, mulheres solteiras, precisam ser abordadas com mais urgência pelos legisladores brasileiros. O editorial da Folha, que reproduzo abaixo, lembra que, segundo a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, 120 mil crianças e adolescentes vivem hoje em abrigos espalhados pelo país e pelo menos 12 mil precisam de uma nova família.

O editorial de hoje:

Adoção digital

A INICIATIVA do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de criar o Cadastro Nacional de Adoção vem em boa hora. A medida vai unificar e cruzar os dados de todos Estados brasileiros seja em relação às crianças a ser adotadas, seja sobre os candidatos a pais adotivos.
A utilização de recursos de informática que facilitam intercâmbios é sempre positiva. O problema das adoções, porém, é bem mais complexo do que juntar ofertantes e demandantes.
Diga-se, em favor das instituições, que a situação já melhorou bastante. Algumas décadas atrás, muitos pais em busca de um filho adotivo preferiam arriscar-se na ilegalidade a enfrentar a lentidão do sistema. Mas, com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e a implementação dos Juizados da Infância e da Juventude, o trâmite ficou mais simples e rápido. Hoje, todo o processo pode ser resolvido em apenas dois meses.
Segundo a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, 120 mil crianças e adolescentes vivem em abrigos de todo o país. Desse total, cerca de 12 mil precisam de uma nova família. No Estado de São Paulo, a procura chega a superar a oferta. São 7.500 brasileiros e quase 300 estrangeiros para cerca de mil crianças.
A dificuldade é o descompasso entre os desejos dos candidatos a pais e as características das crianças disponíveis. Estudo feito com pessoas inscritas na fila da adoção em São Paulo, em 2005, mostra que grande parte das pessoas pretendia adotar só um filho (99%), menor de três anos (83%) e de cor branca (49%). Já a maioria dos abrigados é de cor negra ou parda (52%), maior de três anos (87%) e possui um ou mais irmãos (56%), núcleo que a Justiça, com toda a razão, tenta manter unido.
O que importa, portanto, é modificar a cultura dos pretendentes a pais, para que aceitem crianças reais e não idealizações. Essa, porém, é uma tarefa que não pode ser feita por um programa de computador.

2 comentários:

Olga de Mello disse...

A adoção deve ser estimulada, sim.
Vc sabe que eu só não adotei porque... bem, nem deu tempo, né?
Mas estou pronta a batizar Melody Maker e Secret Victory ...

MB disse...

Não esqueça que este descompaso entre a pretenção dos pais e a realidade das crianças se dá em grande parte pela morosidade dos processos.

Uma criança fica em abrigos anos, sem voltar a sua familia, e nem ser liberada para adoção. Quando isso finalmente se resolve, essa criança saiu fora da faixa etária desejada.

Quem sabe se o Brasil pensasse mais no direito da criança e menos no direito dos pais, e retirase o patrio poder daqueles que violentam suas filhas, espacam, abandonam, expoem a riscos por descuido grave, ao invés de ficar anos tentando reitegrar estas familias, o problema fosse bem menor.

Quem tem um filho, ou uma criança que ame muito, olhe bem para ela, e diga de coração, se fosse esta, a criança a ser reintegrada a um lar como esse, como vc se sentiria a respeito ? Seria favoravel a esta tentativa ?