sábado, maio 02, 2009

ENTREVISTA/Barry Libert

O Valor Econômico publicou neste fim de semana, na revista Eu&Cultura, a entrevista que fiz com o especialista em redes sociais Barry Libert. O homem lançou aqui nos EUA em janeiro Obama Inc., em um lance inegavelmente oportunista, transportando o fenômeno Obama às prateleiras de auto-ajuda para empresários e políticos. Como sabemos, desespero não falta, aqui e aí, nas duas classes.

O resultado é uma espécie de manual em que as virtudes de Obama servem de fórmula para o sucesso de empreendedores mundo afora. Tenho lá minhas dúvidas, mas Libert é simpático e fala bem, até dando dicas para virtuais candidatos ao Palácio do Planalto no ano que vem.


Ó só:


Na quarta-feira, o presidente Barack Obama completou 100 dias na Presidência dos Estados Unidos, marco simbólico presente no imaginário americano desde quando Franklin Delano Roosevelt chegou à Casa Branca, em meio à Grande Depressão, no começo dos anos 1930. Celebrado pelos democratas por conta de sua aceitação popular na casa dos 65%, o ex-senador de Illinois e sua meteórica ascensão são a matéria-prima de A Estratégia de Barack Obama, lançado nos Estados Unidos em janeiro e que a Campus/Elsevier publica
esta semana no Brasil.

Barry Libert e Rick Fault, os autores do livro (cujo título original é o mais inspirado "Obama, Inc."), são nomes imediatamente relacionados ao desenvolvimento e à administração de comunidades interativas no mundo digital: ocupam, respectivamente, a presidência e a chefia executiva da empresa Mzinga, especializada em criar soluções de software para redes sociais de empresas.

O
Valor conversou com Libert sobre as iniciativas de Obama nos primeiros três meses de governo e o impacto que sua vitoriosa estratégia de campanha, em grande parte apoiada em recursos de comunicação encontrados na internet, pode ter causado nos modos de se pensar o gerenciamento de empresas e também na formatação de disputas eleitorais em outros países.

Valor: O sr. teve a ideia para escrever o livro durante a campanha eleitoral?
Barry Libert: O senador John McCain, o candidato republicano, sequer sabia como usar a internet. E em um primeiro momento, a senadora Hillary Clinton parecia, até por ser mulher, saber como se comunicar melhor com o eleitor. Mas o livro surgiu quando comecei a escrever em meu blog sobre a emergência do primeiro líder social dos Estados Unidos no século XXI. Um político que se apropriava das novas tecnologias de forma brilhante, que entendeu como poucos o poder da interação social no mundo digital. Quando ele foi eleito, decidi que queria escrever um livro que tratasse dessa revolução na administração de uma campanha eleitoral, mas que não apenas registrasse o fato de ele ter usado o Myspace, o Youtube e seu próprio Mybarackobama.com com maestria, mas que mostrasse que todo profissional com papel de liderança poderiam aprender a importância de ser um líder social.

Valor: Quais as qualidades do líder social?
Libert: Ele é aquele que entende que negócios - e governo - são, sim, assuntos pessoais. Quando alguém diz a Barack Obama "eu te amo", e ele responde "eu te amo também", está aí uma mensagem tão íntima quanto efetiva. Já vivemos a era daquele que se dizia não ter nada de que se desculpar, por que era o comandante-em-chefe do país. Essa época acabou. Se eu disser para minha mulher, depois de 27 anos de casamento, "querida, sou o comandante-em-chefe", ela me despacha na hora. Não consigo pensar em nenhum outro governante com a capacidade de
comunicação de Obama, o único líder social planetário no momento, ao mesmo tempo transparente e com força pessoal.

Valor: O USA Today, em sua edição que marca os primeiros 100 dias de Obama na Casa Branca, diz que o segredo de seu sucesso parece ser "um equilíbrio entre descontração e firmeza, a vontade de exercer o poder e a capacidade de sedução, o cultivo de um tom professoral, quase ao ponto de se mostrar alheio aos interlocutores, sem perder a capacidade de negociar pequenos detalhes, jamais esquecendo de seus objetivos centrais à frente". São estas as características fundamentais, hoje, na administração de um país ou de um negócio de ponta?

Libert: Sim. Obama compreende que o grande desafio de seu governo - e de qualquer modelo de administração nos dias de hoje - é se mostrar próximo de todos, mas sem deixar de fazer o seu trabalho, de cumprir seus objetivos. E este é um equilíbrio muito difícil de alcançar.


Valor: Uma das grandes inovações da nova administração tem sido o uso do YouTube como ferramenta de comunicação direta com o público. Não há aqui um risco de populismo no contato direto do presidente com os cidadãos, com a eliminação da figura do jornalista como mediador?
Libert: Obama não usa mais nem mesmo a bancada do governo, na Casa dos Representantes, onde tem folgada maioria, por exemplo, para levar sua mensagem para o público. Os congressistas, como sabemos, têm seus próprios interesses. E nas democracias contemporâneas o mundo dos negócios e o da política têm sido cada vez mais voltados para o interesse desses protagonistas, e não da comunidade ou dos consumidores. Obama oferece uma volta à ideia do governo do povo, com o povo, para o povo. E o mundo dos negócios precisa entrar nesse barco: negócios do povo, para o povo, com o povo. O descompasso, aí, foi uma das razões da atual crise financeira. Não por acaso, muitos dirigentes empresariais e financeiros estão assustados com a realidade dos novos modos sociais de comunicação.

Valor: Quais são as principais lições que as empresas podem tirar da vitoriosa campanha de Obama?
Libert: São três lições básicas. A primeira, manter-se sempre calmo. Comandar não pressupõe raiva, zanga. Outra: liderar pelo exemplo. Seja coerente. E a terceira: use toda a tecnologia disponível para se conectar com as pessoas individualmente, abrindo espaço para que cidadãos se conectem diretamente com você de forma íntima. Pense na Garota Obama, que se transformou em fenômeno na internet ao gravar vídeos confessando que tinha uma queda pelo senador. Pense que campanha de base, hoje, também é feita na mídia eletrônica. E você precisa ser o agente da mudança. Se você quer que as pessoas usem "twitter" ou achem você e sua empresa no myspace, o movimento tem de começar com você.

Valor: A internet de banda larga, no Brasil, é considerada por especialistas uma das piores do mundo, lenta e cara. As lições pinçadas em seu livro não seriam menos aplicáveis à realidade brasileira?
Libert: De modo algum. O livro oferece aos brasileiros pistas de para onde o mundo dos negócios está indo. É impossível evitar as novas tecnologias. A internet, mesmo a que chega através dos celulares, aumenta a velocidade de tudo e oferece mais oportunidades de que a voz do eleitor, do consumidor, do cidadão, seja melhor ouvida. É inevitável. E, exatamente, como democracia, se espalha por conta própria.

Valor: Várias empresas brasileiras sequer permitem que seus funcionários tenham acesso a redes sociais como myspace ou que usem ferramentas como mensagem instantânea no local de trabalho...
Libert: Isso acontece nos Estados Unidos também, e é um erro. Construo redes sociais para as mais diversas companhias e a resistência é enorme. É a visão tradicional, de quem não quer dar voz aos funcionários. Comete-se o claro e terrível erro de se preferir não ouvir o que o empregado tem a dizer. O benefício de se abrir uma rede social para funcionários e clientes é o de se contar com consumidores mais integrados, que comprarão mais, empregados mais conscientes do projeto da empresa e acionistas cientes do caminho trilhado pela instituição.

Valor: De que modo os candidatos à sucessão do presidente Lula podem se inspirar na campanha de Obama para a disputa presidencial de 2010 no Brasil?
Libert: Obama conseguiu a contribuição recorde de US$ 800 milhões fazendo com que as pessoas acreditassem estar criando, de fato, o sucesso daquele político. Ele apostou, de modo certeiro, que o futuro é das grandes comunidades sociais. Um candidato ao poder em Brasília, sendo inteligente, vai deixar que as pessoas criem suas próprias marcas relacionadas a ele, como fez a Garota Obama. Vai abrir um espaço real para que as pessoas tenham voz em sua campanha. Vai redefinir a noção de participação. E vai deixá-las usar a criatividade em seu benefício. Enfim, a ordem é deixar que eleitores e consumidores carreguem a sua marca por você.

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