segunda-feira, março 23, 2009

De Volta (Gran Torino e a Violência Made in USA)

As andorinhas voltaram, e eu também voltei. A primavera chegou, o frio diminuiu e já não estou mais no Rio. Mãos à obra então, que este blog esteve às moscas enquanto eu via amigos, família e Brasil.

Neste fim de semana o
Valor publicou texto meu sobre o aumento da violência urbana dos EUA por conta da recessão. Parti do bom filme do direitão Clint Eastwood completamente ignorado pela Academia de Hollywood, Gran Torino, e cheguei a este retrato da violência made in U.S.A., incluindo as gangues que já atuam no meio das comunidades brasileiras por aqui:

Todo dia é um dia de fúria
Por Eduardo Graça, para o Valor, de Nova Iorque
20/03/2009


Em cartaz nos cinemas brasileiros, "Gran Torino" conta a história de um veterano da guerra da Coreia que se transforma, muito a contragosto, em defensor-mor de uma comunidade asiática refém de uma das muitas gangues étnicas em atividade nos Estados Unidos. O filme, dirigido e protagonizado por Clint Eastwood, foi um sucesso de bilheteria em um país que acaba de chegar, de acordo com o Centro Nacional de Inteligência de Gangues do Departamento de Justiça, ao marco de 1 milhão de integrantes de organizações criminosas.

Eastwood filmou "Gran Torino" no coração do estado do Michigan, um dos mais atingidos pela crise econômica. No filme, seu Walt Kowalski vê o antigo bairro de classe média baixa de Detroit, onde vive há décadas, transformar-se em área residencial preferencial dos hmong, grupo étnico que lutou ao lado dos Estados Unidos contra os comunistas no Vietnã e no Camboja e garantiu guarida em solo americano depois da derrota militar nos anos 1970. Os imigrantes, que pagam aluguéis baixos em uma área afetada duramente pela recessão, são o alvo preferencial de uma gangue que age na região. No momento crucial do filme, o moderno caubói vivido por Eastwood decide enfrentar os delinquentes sozinho, com resultados trágicos. Fica difícil não pensar na periferia paulistana ou na zona norte do Rio.

Para o professor David M. Kennedy, um dos maiores especialistas em violência urbana dos Estados Unidos, ainda é cedo para falar de um "efeito Gran Torino" (o título do filme refere-se ao carro produzido pela Ford nos anos 1970) nos centros urbanos americanos. "É fato que a violência aumenta em períodos de crise econômica, mas, aqui nos Estados Unidos, não significativamente. Os principais fatores de aumento da violência são as epidemias de droga como as que tivemos nos anos 1970, com a heroína, e na virada dos 80 para os 90, com a cocaína e o crack. Não creio que uma recessão prolongada possa levar a uma explosão de violência urbana no país", diz Kennedy.

De acordo com o FBI, 80% dos crimes registrados hoje nas cidades americanas são cometidos por integrantes de gangues espalhadas por todos os estados. Em estudo realizado pelo órgão e obtido pelo jornal "USA Today" no fim de janeiro, as gangues já se transformaram nas maiores distribuidoras de drogas ilícitas no país, em competição direta com os grandes cartéis mexicanos. Em quatro anos, o crime organizado teria amealhado 200 mil novos integrantes.

A Midwest Gang Investigators Association, especializada na monitoração de grupos de criminosos em regiões como a Detroit de Walt Kowalski, acredita, porém, que o número seja ainda maior, em uma expansão crescente na última década. Detalhe: do pouco mais de 1 milhão de integrantes das gangues, de acordo com o FBI, apenas 147 mil estariam presos. "A maioria das regiões dos Estados Unidos vai experimentar um aumento na atividade de gangues organizadas de criminosos", prevê o relatório.

Até mesmo gangues brasileiras começam a aparecer no noticiário da Costa Leste. Em dezembro, a polícia de Framingham, em Massachusetts, um dos centros da colônia brasileira na Nova Inglaterra, informou que uma das gangues ativas na cidade era formada por pelo menos 40 brasileiros e descendentes de brasileiros. No total, nove gangues atuariam na cidade. O trabalho da polícia local tem focado na prevenção, investindo em inteligência, para evitar o recrutamento de novos membros, atuando especialmente em escolas e identificando jovens que têm irmãos, primos ou vizinhos associados a grupos de infratores. A maior das gangues locais, a Kendall Street Thugs, contaria com 56 integrantes, se concentraria no tráfico de drogas e já teve a ousadia de abrir perfis no Myspace, um dos sites de comunidade social virtual mais importantes.

Com o aparecimento de um bando brasileiro, a polícia de Framingham abriu seleção para a contratação de dois policiais fluentes em português. Os dois americanos, de origem brasileira, já estariam completando os estudos na Academia de Polícia para começar a trabalhar com a comunidade.

"O que as pessoas se perguntam quando veem esses números é: estamos condenados a entrar em uma era de problemas sérios relacionados à violência urbana? E eu digo e repito: não creio. A mitologia aqui é maior do que a real organização. É impensável, ainda, imaginar gangues binacionais que enviem para os Estados Unidos bandidos armados e treinados por organizações criminosas que usem o mesmo nome em outros países do continente, como El Salvador ou mesmo Brasil. Até mesmo se pensarmos historicamente, os anos 1930, no auge da Grande Depressão, apresentaram taxas baixíssimas de criminalidade. Ao contrário, na década anterior, em que vivemos um boom econômico, crime e violência estavam em alta", diz Kennedy.

Uma diferença importante entre as duas décadas foi a proibição de venda de bebida alcoólica durante os pouco violentos, mas dificílimos, anos da Grande Depressão. "Mas, veja bem, não faço uma conexão direta entre droga e violência e sim entre mercado de drogas ilegais e criminalidade. E nas últimas décadas o tremendo investimento em inteligência, controle de crimes e fortalecimento das forças policiais nos Estados Unidos impediu explosões de violência e possibilitou índices recordes de civilidade em metrópoles como Nova York e Boston", explica Kennedy.

Kennedy diz ainda que não acredita na descriminação de drogas consideradas menos danosas, como a maconha, como estratégia para redução de criminalidade em tempos de crise nos grandes centros urbanos dos Estados Unidos, defendida recentemente pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, entre outros. "Antes de mais nada, é preciso deixar claro que esta, por aqui, é uma discussão abstrata. Não há a menor possibilidade de descriminação de drogas nos Estados Unidos de hoje. Mesmo que houvesse, não acredito ser esse o caminho para a redução da violência urbana. Haveria uma diminuição de atividade de gangues, mas os danos em nossas comunidades seriam intensos também. É só observar o estrago de uma droga permitida, como a anfetamina", afirma.

Curiosamente, uma das mais recentes campanhas da imprensa liberal americana - o "The New York Times" à frente - é para que a nova dominância democrata reverta no desaparecimento de leis como as aprovadas pelo governo republicano de Nelson Rockefeller nos anos 1970, consideradas pelos conservadores um marco na transformação urbana de Nova York, então tomada por gangues. A legislação, aprovada em 1973 pôs o consumidor de drogas como maconha, flagrado com mais de 113 gramas, sujeito a até 15 anos de encarceramento. Trinta e cinco anos depois, os Estados Unidos enfrentam um problema complicadíssimo, a superlotação das cadeias, repleta de infratores acusados de cometer pequenos crimes.

Para o professor Kennedy, o Brasil não deve cair na tentação de adotar medidas semelhantes em suas metrópoles. "Nesse caso, os jornais estão certíssimos. E não creio que Rio e São Paulo devam se inspirar em leis draconianas como as de Rockefeller. Os resultados, aqui, não foram dos melhores. Seria como se o Brasil resolvesse pedir conselhos a Elizabeth Taylor para lidar com dependência química", observa Kennedy.

2 comentários:

Olga de Mello disse...

IUHU!!! Depois de arrancar a pele das amigas nas areias cariocas, você volta em tão boa forma quanto o Clintão, né?
ADOREI a matéria!!!!

Anônimo disse...

Deixem-se de "tretas": primeiro a culpa era dos livros de banda desenhada violentos, depois dos filmes violentos e agora dos jogos violentos

A verdade é que as actuais formas de educação estão erradas: "está tudo de pernas para o ar"

Os professores estão hoje impedidos de castigar fisicamente os alunos, mas não só: os próprios pais estão hoje sujeitos a duras penas se o fizerem em muitos países, incluindo em Portugal, por isso começou já a dar-se uma inversão em termos de autoridade que passou dos professores para os alunos e até dos pais para os filhos. Por isso não é de espantar que os professores tenham muita dificuldade em manter a ordem na sala de aula e por vezes nem o consigam, chegando até a ser severamente agredidos por alguns alunos. Começam também a surgir casos de pais que são duramente castigados pelos seus filhos quando não lhes satisfazem os caprichos, o que chega a acontecer em público, tendo sido já mostrado na televisão. Isto prova que os actuais conceitos de educação estão errados e um dia as ideias que agora dominam, de não aplicar quaisquer castigos físicos em quaisquer circunstâncias, terão que mudar. O Governo Português também não os admite por serem condenados pelo ocidente e pela EU, onde as mudanças terão que ocorrer primeiro. O problema nesses países é até mais grave do que por cá, por isso, em breve, deverão chegar à conclusão que alguns castigos físicos terão que ser repostos pelos pais e até pelos professores, sob pena de estarmos a criar cada vez mais pessoas inúteis, que não se adaptarão a cumprir nem ordens, nem horários, nem quaisquer outras regras, e que viverão sempre à custa dos outros porque é mais fácil, até porque foram habituados a fazer sempre apenas o que lhes dá prazer. Na vida real não é assim e como diz o ditado “de pequenino é que se torce o pepino”...
Os castigos físicos eram bem tolerados pelas anteriores gerações de pais e no futuro voltarão a sê-lo porque compreenderão a necessidade de ser dada autoridade aos professores para castigarem os alunos mal comportados para a protecção dos seus filhos que são as primeiras vítimas dos colegas delinquentes. Actualmente as escolas não têm meios de os proteger. Há até um abuso de linguagem ao se apelidar de "crianças" a todos os jovens de menor idade. Até parece que a inteligência e a capacidade de distinguir o bem do mal chega na noite em que completam dezasseis anos. Mas uma “criança” de três anos terá a mesma capacidade de entendimento de uma de uma outra treze? Agora já não temos um vocábulo que as distinga a não ser que continuemos a chamar “bebé” à de três anos, o que também não me parece correcto! Fazendo um esforço para compreender a extensão do termo “criança” a todos os rapazes e raparigas apenas concluo que é apenas para menosprezar o aumento da delinquência e da criminalidade nas camadas jovens, porque sendo praticada por crianças não se lhes dá tanta importância.
Afinal nem tudo é mau porque a maioria das crianças continua bem comportada e não necessita de tareia. Mas só o facto de se saber que o castigo é possível é só por si um desincentivo ao mau comportamento.
É claro que quando apoio os castigos físicos em casa e nas escolas me refiro apenas até cerca dos dez ou doze anos, o que deverá ser suficiente para socializar o aluno, mas, se não for, os jovens em causa deverão ser encaminhados para casas de "correcção" (ou outro nome que julguem mais conveniente) onde, com apoio psicológico, sejam habituados compulsivamente a cumprir regras, como: levantar, comer e deitar a hora certa e tratarem eles próprios das suas necessidades pessoais, aí as actividades de lazer deverão ser permitidas mas canceladas em caso de mau comportamento. Se até isso falhar então deverão ser casos perdidos.

Zé da Burra o Alentejano