quarta-feira, junho 28, 2006

Diretinho da Redação (46)


O texto da semana já está no DR. O editorial do The Wall Street Journal, um tiro de canhão contra os governos da Venezuela, Argentina, Bolívia, Cuba e Brasil, pode ser lido aqui.

ELEIÇÃO PARA O CONSELHO DE SEGURANÇA

Eduardo Graça

Durante todo o governo Bush Jr. tem sido assim: a América Latina só entra na pauta de Washington quando o tema é segurança internacional. Na sexta-feira, o conservador The Wall Street Journal publicou em sua página de opinião um texto venenoso alertando para o novo movimento de uma das mais importantes ameaças para a paz mundial – Hugo Chávez. Em “Votar na Venezuela é Votar no Irã”, a jornalista Mary O’Grady procura constranger os países do continente que declararem seu apoio a Caracas. Por sua “aliança estratégica com Teerã”, a Venezuela simplesmente estaria proibida de sentar cadeira no Conselho de Segurança da ONU. Em nome da segurança planetária.

Como se sabe, apenas cinco cadeiras no órgão mais importante das Nações Unidas são permanentes – e seus donos são os EUA, a China, a Rússia, a Inglaterra e a França. Outras cinco das 10 vagas rotativas do conselho serão renovadas no segundo semestre. A que hoje é ocupada pela Argentina, em um mandato de dois anos, está entre a Venezuela e a Guatemala, esta última incentivada pelos falcões republicanos. E, como para se passar qualquer resolução é necessário o apoio de nove eleitores, cada voto é de vital importância. O’Grady, responsável pelos editorais do continente no jornalão de Nova Iorque, não vê motivos para os países da América do Sul e do Caribe se unirem em torno da Venezuela. Afinal, a Guatemala é uma democracia liberal, e Chávez um caudilho da pior categoria.

Como uma boa dose de História não faz mal a ninguém, vale lembrar que, desde 1954, quando a C.I.A. fomentou o golpe contra o presidente eleito Jacobo Guzman, a Guatemala viveu uma das mais sangrentas ditaduras da América Central, com a implantação de um verdadeiro regime de terror contra a maioria étnica, índios de origem maia. Mesmo depois dos acordos de paz de 1996, os abusos continuaram.

De acordo com a Anistia Internacional os bandidos dos esquadrões da morte ligados às Forças Armadas que agiram livremente no país nas últimas décadas jamais sofreram qualquer punição. A violência sexual contra mulheres é gritante, chegando-se ao número recorde de 605 assassinatos registrados pelas autoridades locais no ano passado. Por estas e outras, a AI apelidou a Guatemala de "terra da injustiça".

Mas nada disso importa. Se as coisas continuarem como estão, a Guatemala seguirá uma aliada ferrenha dos EUA e votará com o país nas decisões do Conselho de Segurança. O mesmo não se pode esperar de Chávez. E, por isso, o Journal não vê problema algum em publicar que “a Guatemala, ao contrário da Venezuela, tem um histórico de cooperação com a ONU”. E que Caracas, hoje dominada por uma ‘ditadura do petróleo’, cujos principais valores são a ‘tirania e a opressão de sua população’, quer a cadeira para defender estados ‘hostis’ como “Coréia do Norte, Cuba e Sudão”. A Guatemala, em contrapartida, estaria interessada em ser "a voz da região".

O jornal vai além, esculhambando o governo Kirchner e sua Argentina, este “refúgio de nazistas, porto seguro para terroristas chilenos e espanhóis, que administrou tão mal seus recursos que agora sobrevive da caridade de Chávez”. Sobra também para os companheiros encastelados em Brasília, que estariam “orquestrando o confisco do gás boliviano, e tratando os interesses dos cidadãos brasileiros com descaso e de modo indigno”. A exceção fica por conta das “democracias sérias” do mundo abaixo do Arizona: o México e a Colômbia. Detalhe: o Journal é hoje o segundo jornal diário de maior circulação nos EUA, com mais de dois milhões de exemplares em média, só perdendo para o USA Today.

O embaixador dos EUA na ONU, John Bolton, já mandou avisar que “um voto na Guatemala é um voto nos Estados Unidos”. A laureada O’Grady é ligada aos neo-cons de Washington e trabalhou durante uma década na Meryll Lynch. Nem ela nem o Wall Street Journal dão ponto sem nó. Na sexta-feira, eles foram além de Bolton. E, em ano de eleição, fica aqui a imensa curiosidade para saber de que modo o Itamarati vai reagir a esta agora explícita tese da direita norte-americana: a de que, na ONU, “um voto em Chávez é um voto nos aiatolás”.

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