sexta-feira, maio 19, 2006

Diretinho da Redação (43)



É Preciso Confessar

Não, é preciso confessar. Não foram os ataques em seqüência. Nem as mortes, horrendas, brutais, encomendadas. Também não foi o governador-biônico afirmando que ‘tudo está normal’ e enquartelando-se no Palácio Bandeirantes sob a proteção da polícia civil. Não foi a ousadia do advogado de um dos líderes do ataque criminoso aos paulistanos, fazendo exigências para que o fim da anarquia fosse decretado. Não foi sequer a decisão do secretário estadual de Segurança de negociar com os ‘capos’ do crime organizado.

O que de fato me derrubou, no fim desta caótica segunda-feira, foi o silêncio que caiu na noite de São Paulo. Foi a derrota calada da maior cidade do país. Com o nariz grudado na televisão e os ouvidos no rádio que berrava em paulistês, eu aguardava, de longe, a reação. Dos paulistanos. De sua elite violada. Da elite sofisticada que levantou as sobrancelhas quando a policia federal ocupou a Daslu. Da elite orgulhosa que reagiu histérica à ameaça boliviana à soberania nacional, humilhação máxima. Da elite pensante, que comanda o governo do país há 12 anos. Da elite, afinal, pronta para exigir seu direito mais básico, a liberdade de ir e vir.

E os paulistanos, sem esperança, sem a menor noção de propriedade do espaço público, sem liderança alguma, voltaram para casa. Quietos. Seguiram o exemplo do governador que não elegeram. Trancafiaram-se em seus condomínios, checaram os alarmes, mandaram blindar mais carros, deram um extra para os seguranças. E só. A cidade que respondeu de cabeça erguida ao cerco de Vargas nos anos 30, a cidade que reagiu como nenhuma outra, nas igrejas, sinagogas e fábricas, à infâmia da repressão militar, tomou seu calmante em busca de um sonho bom. Cúmplice de governos indigentes, que só agem no âmbito das negociatas, a elite paulistana encontrou-se na cama com sua face mais covarde. As madames de Higienópolis dormiram na Nova Iorque do presente e acordaram na Chicago dos anos 20. Um pesadelo que só vai acabar quando o medo do outro, do excluído, do pobre, do nordestino, enfim, do brasileiro, for encarado pela gente ilustrada da cidade mais importante do país.

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