quinta-feira, maio 12, 2005

Diretinho da Redação (14)


O texto abaixo pode ser lido em www.diretodaredacao.com

Lá se foram 60 anos da rendição dos nazistas às tropas aliadas. Enquanto Putin e Bush mediam suas diferenças em Moscou, da cidade de Leipzig, o grande escritor embalava seu libelo. Leipzig foi palco das maiores manifestações pela democracia e contra o regime comunista da Alemanha Oriental em 1989. Lá vive o prêmio Nobel de literatura Günter Grass, autor do texto publicado neste sábado no "The New York Times", que fala muito do mundo em que vivemos, hoje, aqui em Nova Iorque, lá em Leipzig, aí no Brasil. Reproduzo, abaixo, alguns dos trechos mais interessantes do artigo. Semana que vem espero incluir a segunda parte. Aqui, Grass trata da crise da representação política no mundo de hoje - qualquer semelhança com o "severínico" Congresso Nacional não é mera coincidência - e da dificuldade de se lidar com uma liberdade que nos é oferecida e não conquistada.

· "Quando o dia 8 de maio chega eu fico sempre pensando nas celebrações do 'Dia da Libertação', com seus discursos burocráticos e pomposos e me pergunto 'Do que nós, alemães, podemos nos orgulhar?' A primeira resposta é a de termos conseguido, de fato, nos libertar, embora esta liberdade nos tenha sido dada de presente, nos tenha sido empurrada goela abaixo. Não lutamos por ela.

· A questão hoje, então, é a de se pensar se nós realmente usamos bem esta liberdade que nós não conquistamos, mas que nos foi dada? Será que os cidadãos da Alemanha Ocidental compensaram da maneira devida os alemães orientais, que, no fim das contas, foram os que pagaram mais caro pela guerra iniciada e perdida por todos os alemães? E será que nossa democracia parlamentar tem soberania suficiente para garantir a liberdade de se enfrentar os problemas que nos afligem no século XXI?

· Quinze anos depois da unificação, os cidadãos da antiga Alemanha Oriental são considerados pessoas de segunda-classe. O índice de desemprego é duas vezes mais alto no lado leste e não há o mínimo respeito no lado ocidental por um curriculum de trabalhadores que passaramboa parte de sua vida do outro lado do país. Somos um país de 15 milhões de desempregados. A emigração é diária e cidades inteiras estão sendo apagadas da história, esvaziadas da noite para o dia. Depois de comandarem a privatização das empresas estatais do lado oriental, com as barganhas que estes processos sempre incluem, empresários e bancários pararam de investir nesta área do país e os empregos desapareceram. A única saída possível está no Parlamento, que representam a sociedade.

· Mas será que nossos congressistas, eleitos democraticamente, são livres para decidir algum coisa, qualquer coisa que seja? Na Alemanha, mais do que a ideologia dos partidos políticos, grassa o reino dos lobistas, com seus múltiplos interesses, cerceando a atuação dos parlamentares. Conseqüentemente, nosso Parlamento não é soberano em suas decisões. Ele é guiado vergonhosamente por bancos e corporações nacionais - que, por sua vez, não são submetidos a nenhum controle democrático.

· O que nós mais precisamos é de um democrático desejo de se protejer o Parlamento contra as pressões de lobistas que querem mantê-lo inacessível às pressões populares. Mas nossos políticos são suficientemente 'libertos' para optarem por um ato radicalmente, verdadeiramente democrático? Ou nossa liberdade, hoje, 60 anos depois, vale menos do que o lucro acumulado diariamente na bolsa de valores?"

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