terça-feira, outubro 16, 2007

Minha Primeira Vez - artigo de Teté Ribeiro

A querida Teté Ribeiro, jornalista brasileira baseada em Washington D.C. (ou Osasco City, como ela prefere), acabou de enviar um delicioso artigo sobre os prazeres de se conferir Tropa de Elite a quilômetros de distância e utilizando métodos pouco convencionais para conseguir assistir ao filme da hora.

O texto me chegou às mãos no mesmo dia em que entrevistava uma das grandes cabeças pensantes do Vale do Silício, que acabou de lançar um livro em que entra na questão dos direitos autorais nos tempos da economia de nicho, pós-blockbuster. Mas esta é uma conversa para depois. O importante aqui é Teté, que nos reafirma - a primeira vez, para o bem e para o mal, a gente nunca esquece:


Minha primeira vez

Teté Ribeiro, de Washington, para o edudobrooklyn

É sempre estranho fazer uma coisa pela primeira vez. Tanta expectativa, tantas idéias pré-concebidas, tantos medos, tantos desejos, quase todos com pouca ligação com o que a realidade vai desvendar dali a pouco. Foi assim comigo também, e aconteceu nesse último sábado, dia 14. Tinha passado uma sexta-feira 13 daquelas, imaginando que minha primeira vez ia ser adiada e complicada, e, fala a verdade, quando uma coisa acontece na vida pela primeira vez quase sempre já está pelo menos uns meses atrasada, e você só com aquilo na cabeça, sem lugar para mais nada.

Daí, como em uma ficção, quando eu já não tinha mais nenhuma esperança, tocou a campainha. Era mais ou menos meio-dia, eu estava pensando em como escapar da faxineira que vem aos sábados e fica na casa exatamente duas horas, entre duas e meia e quarto e meia. Uma sessão de “Elizabeth 2”? Ou quem sabe “The Jane Austen Book Club”? Ou ler os jornais em um parque, já que o verão no hemisfério norte resolveu dar uma esticadinha esse ano? O que eu queria mesmo, até onde eu sabia, era inatingível. Eu queria ver “Tropa de Elite”! Mas aquela campainha era do carteiro, que tinha um envelope registrado – daqueles que você é obrigada a abrir a porta, dizer bom dia e assinar uma traquitana tipo de cartão de crédito, ou ele não deixa o pacote. E – alegria, alegria – era ele. Meu tão esperado DVD pirata, vindo de São Paulo, mandado por um amigo que me fez jurar que eu não revelaria seu nome, porque, como eu, em princípio ele também é contra a pirataria, onde já se viu uma coisa dessas, e os direitos autorais já tão judiados no Brasil, quem compra é cúmplice, assim como quem assiste.

Então tá, querido, fique você na sua bat-caverna, porque eu vou declarar, aqui em alto e bom tom – e a milhas e milhas distante de qualquer autoridade brasileira – que vi, pela primeira vez, um DVD pirata. E foi bom. Eu estava tão, mas tão curiosa para ver o novo trabalho do ator Wagner Moura e do diretor José Padilha, do grande “Ônibus 174”, que na minha última passadinha pelo Brasil, no meio de setembro, fui ao Rio e nem olhei direito pro mar – meu olho não saía das calçadas, a fim de dar de cara com um camelô que tivesse uma cópia para me vender. Pensei comigo que eu não pagaria mais de R$ 50, era meu teto. E o DVD acabou sendo de graça, porque meu amigo não teria nem coragem de cobrar os ralos R$ 5 que pagou pela cópia do filme, devidamente disfarçado de “BOPE” (o nome que veio na capa, não me pergunte o motivo).

E essa discussão a respeito da pirataria é só uma entre as muitas, todas interessantes, que o filme provoca. Só por isso, ponto para “Tropa”. Qual foi a última vez que um longa-metragem deu tanto pano para a manga desse jeito? Nem “Lust, Caution”, o novo do Ang Lee (o diretor de “Brokeback Mountain”), que estreou aqui nos EUA há duas semanas, e que apesar de ter sido o primeiro filme de grande estúdio em anos a receber o temido PG-17, que proíbe mesmo a entrada de qualquer menor de 17 e espanta uma enorme fatia da audiência, deu tanto o que falar.

Que chova público para o “Tropa”. Que chovam opiniões a respeito, contra, a favor, absurdas. Tudo menos sossego para o diretor, o roteirista Bráulio Mantovani e a equipe técnica e de atores. Que cineasta quer paz, afinal de contas? O Babenco, na última edição que eu recebi pelo correio da revista Set (que por sinal tem uma ótima matéria de “Tropa”), diz em entrevista que ficou frustradíssimo porque seu “Coração Iluminado”, de 1996, não provocou nenhum tipo de reação nem da crítica nem do público. Disso, nem o José Padilha nem nenhum fã do filme (pode me incluir nessa lista) podem reclamar.

Ah, claro, e juro que não faço mais. Também juro que tentei outros métodos antes de partir para a pirataria, mas não tive sorte. Na clandestinidade, bastam R$ 5 e um amigo. E a recompensa é um filmaço. Irresistível. Pelo menos uma vez.

Nenhum comentário: